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sexta-feira, 22 de junho de 2007

Beleza da Matemática


Oi, Alexandre
Não o conheço mas, aproveitando seus comentários, creio que seria interessante que vc, um matemático, explorasse um pouco mais o que é essa "beleza" da simetria matemática e que nesse "encontro" tanto o fascinou!
Em outras palavras, o que há aí que chamamos de "belo"?
Fale-nos um pouco mais sobre isso...
Abs

Olá Fernando,

Sua pergunta é profunda e bastante difícil de responder. Toda a vez que tento definir a beleza da matemática para outra pessoa percebo que o interlocutor não sentiu de fato o que eu gostaria de passar.

Porém, tenho certeza de que muitas pessoas, em especial muitos matemáticos, compartilham da minha opinião de que a matemática é antes de tudo bela. No processo de descoberta é comum caracterizarmos o desenvolvimento realizado como "belo" ou "elegante". Frases como "Que belo teorema !", "Aquela demonstração é muito sutil e elegante." são recorrentes no meio matemático.

Na verdade não sei definir o conceito de beleza, nem no sentido geral, nem no sentido matemático, se é que são diferentes. Mas posso dizer que em matemática, a beleza está próxima de simplicidade, clareza, originalidade e surpresa.

Em geral, uma demonstração curta e simples é mais bela do que uma demonstração longa. Um resultado claro, de fácil entendimento, é mais belo do que um resultado complexo que demanda muito esforço para sua compreensão. Um desenvolvimento original, ousado, criativo, fora do comum, será sem dúvida reconhecido como belo.

Se além de tudo isso, a demonstração causar surpresa, é bastante provável que o leitor a considere assombrosamente bela. "Surpreendente!" ele dirá e nunca mais vai esquecer o teorema. Há vários exemplos bastante conhecidos de teoremas que são unânimamente considerados belos, como a prova atribuída a Euclides da Infinidade dos Números Primos, ou a demonstração de que a diagonal do quadrado é um número irracional.

Quando uma pessoa curiosa, mas não matemática lê ou escuta que há uma prova de que existem infinitos números primos ela provavelmente pensará: Como alguém pode provar que existem infinitos elementos de alguma coisa? Se esta mesma pessoa ler e entender a demonstração, perceberá que não há alternativa alguma a não ser que, de fato, existam um número infinito de números primos. Isso causará surpresa, prazer intelectual e o contato com uma sensação de VERDADE nunca experimentada anteriormente.

A verdade e a certeza que a matemática nos traz não pode ser subestimado na construção da nossa percepção da beleza. Nossa vida é repleta de incertezas, não sabemos se vamos ter emprego no mês que vem, se vamos ser bem sucedidos neste ou naquele projeto, se nossos filhos vão ser felizes, etc..., etc... etc... mas EXISTEM INFINITOS NÚMEROS PRIMOS. Parece bobo comparado com nossas necessidades reais mais o tipo de certeza que a matemática fornece, nos traz conforto, alento, e por que não, prazer. Trazendo prazer, queremos contemplar mais e mais esta verdade. Enfim, o que dizemos quando queremos contemplar algo mais tempo? Que este algo é belo.

É impossível esgotar o assunto e tenho a impressão de que qualquer linha argumentativa é pobre frente a contemplação de uma demonstração real que pretendo mostrar para finalizar este texto.

Para sair do lugar comum apresentarei uma demonstração não muito conhecida que acho muito bela atribuída ao matemático medieval Nicolau Oresme relacionado com a soma de uma série infinita.

Sabemos que a soma 1 + 1/2 + 1/4 + 1/8 + ... é igual a 2. Este resultado por si só é bastante surpreendente afinal estamos somando infinitos termos e obtendo um número finito, isto é 2.

Da mesma forma 1 + 1/3 + 1/9 + 1/27 + ... é igual a 3/2. De novo, uma soma infinita resultando num valor finito. E isso vale para qualquer série da forma 1 + 1/k + 1/kk + 1/kkk + ...., se k for maior do que 1.

Agora, e a série 1 + 1/2 + 1/3 + 1/4 + 1/5 + ...? Ela é igual a um valor finito ou ela é igual a infinito como é a série 1 + 1 + 1 + 1 + ...?

Oresme mostrou que a série 1 + 1/2 + 1/3 + 1/4 + 1/5 + ..., também chamada de série harmônica, é igual a infinito, formalmente Oresme provou que a série harmônica é divergente. Observe a simplicidade e elegância da demonstração.

Note que:

1/3 + 1/4 > 1/4 + 1/4 portanto 1/3 + 1/4 > 1/2

1/5 + 1/6 + 1/7 + 1/8 > 1/8 + 1/8 + 1/8 + 1/8 portanto 1/5 + 1/6 + 1/7 + 1/8 > 1/2

1/9 + 1/10 + ... + 1/16 > 1/16 + 1/16 + ... + 1/16 (8 vezes 1/16) portanto 1/9 + 1/10 + ... + 1/16 > 1/2

Podemos portanto reescrever 1 + 1/2 + 1/3 + 1/4 + 1/5 + 1/6 + 1/7 + 1/8 + ... como 1 + 1/2 + (1/3 + 1/4) + (1/5 + 1/6 + 1/7 + 1/8) + ...

Enfim,

1 + 1/2 + (1/3 + 1/4) + (1/5 + 1/6 + 1/7 + 1/8) + ... > 1 + 1/2 + (1/2) + (1/2) + ...

Ora sabemos 1 + 1/2 + (1/2) + (1/2) + ... é igual a infinito. Então, obviamente 1 + 1/2 + (1/3 + 1/4) + (1/5 + 1/6 + 1/7 + 1/8) + ... também é igual a infinito.

Bom não sei se você irá achar bela esta demonstração, afinal beleza é pessoal, mas tenho certeza de que há alguma demonstração, algum resultado que você irá considerar belo ou elegante ou interessante.

Um abraço

Alexandre

2 comentários:

Anônimo disse...

Olha, gostei mesmo do comentário de Alexandre sobre a matamática e um pouco sobre sua beleza.
No momento estou escrevendo um trabalho sobre a beleza da matemática e nele insiro alguns notáveis números irracionais, como o pi, phi, euler e penso em colocar algumas constabtes incríveis, como a da gravitacional, de Planc e etc...
Gostei muito da demonstração que me fez lembrar da tbm bela demosntração do número de euler por limite ou do valor de pi por derivadas.
Peço, por favor, se houver mais informação desse tipo, que postem, porque a matemática está mesmo associada ciência fria e fora das relações interpssoais. Mas isso não é verdade,mais que divina, ela é humana, carregada com nossos sentimentos e a vontade perene desempre chegar á eternidade. E ela pode...

Um abraço para o Alexandre a para todos que tornam possível essa página na net!
Edmarcos Jordão

Anônimo disse...

ler todo o blog, muito bom

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